O maior prêmio internacional de engenharia que consagra os trabalhos desenvolvidos por mulheres engenheiras de todas as nacionalidades, o WFEO GREE Award Women, contemplou neste ano a engenheira portuguesa Elvira Fortunato por suas soluções científicas na área dos materiais e da eletrônica transparente, como a produção dos primeiros transistores de filme fino de óxido, utilizando materiais sustentáveis, totalmente processados à temperatura ambiente. O trabalho foi considerado de caráter revolucionário pela Ordem dos Engenheiros (OE), que integra a World Federation of Engineering Organizations (WFEO).
Elvira Fortunato, vice-reitora da Universidade Nova de Lisboa e diretora do Instituto de Nanomateriais, Nanofabricação e Nanomodelagem da universidade europeia, é pioneira na invenção de transistores de papel. Um transistor é um componente de circuito elétrico que possui duas funções básicas: amplificação de sinal ou chaveamento, onde o dispositivo opera como uma chave aberta ou fechada, permitindo ou barrando a circulação de corrente elétrica; eles são os componentes básicos de todos os chips eletrônicos, como aqueles presentes nos computadores.
Para fazer um transistor, são necessários materiais isolantes, condutores e semicondutores. No caso da invenção premiada, em vez de utilizar, como de praxe, um filme isolante de óxido de silício, o material isolante escolhido para o transistor foi o papel. Além disso, o papel também exerce a função de substrato, onde os transistores são construídos para dar origem ao circuito integrado.
Baixo custo, possibilidade de ser feito em temperatura ambiente (um transistor com óxido de silício precisa ser submetido a temperaturas de mil graus Celsius) e processo de fabricação menos poluidor que o transistor de silício. Essas são algumas das principais vantagens da utilização do substrato de celulose em transistores.
“Fazer um transistor de papel é bem mais barato que o processo de fabricação normal. O desafio atual é encontrar um nicho de mercado que deseje investir”, afirma Carlos Teodósio, professor do Departamento de Engenharia Eletrônica e de Computação (DEL) da Escola Politécnica, especialista em microeletrônica e processamento de sinais.
Porém, ele se mostra otimista sobre as diferentes possibilidades de aplicações desse tipo de material. “Um chip feito de papel nas embalagens dos produtos, já com seus preços, poderia facilitar a rotina no supermercado. Ou caso fosse aplicado em passaportes, isso auxiliaria a Polícia Federal na identificação e comprovação da veracidade do documento”, explica.
Já o professor José Gabriel Gomes, também do DEL/Politécnica-UFRJ e especialista em redes neurais e sensores de imagem CMOS, levanta a possibilidade do recurso ser utilizado para entender e aperfeiçoar o desempenho de atletas e facilitar a rotina por meio de objetos inteligentes.
“Digamos que ocorra um evento esportivo e deseja-se avaliar algumas medidas associadas ao comportamento dos atletas na corrida, peças de roupas exclusivas com biossensores feitos de papel podem atender a essa expectativa. Esse tipo de tecnologia também permite incorporar funcionalidades eletrônicas a objetos do dia a dia, por exemplo, caixas e etiquetas inteligentes”, explica Gomes.
Há uma tendência mundial em substituir a maioria das embalagens de plástico por embalagens à base de papel, devido ao acúmulo de plásticos nos oceanos e o longo tempo que levam para se decompor. A eletrônica de papel surge como uma possível solução para esse problema. Numa sociedade cada vez mais integrada, em que se deseja que todas as coisas sejam inteligentes, pensar em tecnologias sustentáveis é também uma forma engenhosa de avançar cientificamente e de forma integrada ao meio ambiente.
Para ler o trabalho de Elvira Fortunato, acesse:
https://ieeexplore.ieee.org/document/4604837.
Referência:
E. Fortunato, N. Correia, P. Barquinha, L. Pereira, G. Goncalves and R. Martins, “High- Performance Flexible Hybrid Field-Effect Transistors Based on Cellulose Fiber Paper,” in IEEE Electron Device Letters, vol. 29, no. 9, pp. 988-990, 2008.